Diário da Horta IV


Já lá vão quase dois anos desde que aqui cheguei e, sinceramente, até há bem pouco tempo ainda não me tinha organizado para colocar em prática um verdadeiro projeto-horta. Mais do que nunca, os tempos são de crise, e por cá ela veio para ficar! Por isso, seria absurdo se eu não tirasse proveito desta minha quintinha para fazer uma bela de uma horta. Do pensamento à prática, muito tive de maturar.

Não sou serrana, apesar de ter adotado esta vida, não tenho quaisquer raízes no campo. Sou aquilo que se chama de uma alfacinha de gema. Não sei o que é ir à terriola pelas férias, nem o que são os avós a levar coisas boas da horta quando vão de visita à cidade. A minha família é oriunda de Lisboa desde tempos remotos.

Não sabendo bem porquê, sempre tive uma ligação especial com o campo, ao qual vinha raramente. Posso mesmo dizer que as minhas experiências em arqueologia, foram aquilo que mais próximo tive da vida no campo. O certo é, que esta paixão veio para ficar. O que há uns anos era um sonho ilusório (o de vir um dia a viver numa casinhota rústica)hoje, tornou-se realidade. A oportunidade deu-se e aqui estou eu, no coração da serra, num abrigo de pedra bem típico das terras da Beira.

Para não perder o fio desta meada, devo dizer, então, que apesar de adorar esta vidinha, demorou algum tempo a adaptar-me ao sítio e aos ritmos. Nos primeiros tempos, até a diferença de altitude mexia comigo, provocando-me fortes dores de cabeça. Mas, adiante...
Resumindo, vi-me a morar numa quinta relativamente grande, cheia de giestas, pinheiros e carvalhos... terra por desbravar. Por outro lado, à exceção de uma enxada aqui, um sacho acolá, nem sequer tinha o material necessário para trabalhar este pedaço de terra. Não foi, portanto, difícil desmoralizar. Uma coisa é termos um pedacinho de terra para fazer experiências, outra é vermo-nos a braços com um grande terreno, sem ter qualquer experiência agrícola, ou mesmo, conhecimentos teóricos.

De início, como faço para aprender o que quer que seja, li muitas coisas, desde o borda d'água a livros técnicos. Não fiquei propriamente na mesma, mas andei lá perto. Foi então, que ao longo destes quase dois anos, ao conversar aqui e ali com a vizinhança, fui aprendendo umas coisinhas, e, finalmente, a minha preparação acabou. Agora, resta pôr em prática o saber ancestral destas gentes. Uma coisa aprendi: melhor que mil livros sobre agricultura, nada como ouvir e aprender com quem sabe. Os livros são generalistas e cada sítio tem a sua especificidade. Por exemplo, aqui temos uma grande inimiga chamada geada, e só os locais nos sabem aconselhar acerca dos melhores truques para a combater.

Continuando... após algumas tentativas frustradas de horta, finalmente, consegui afeitar-me à coisa e decidi entregar-me à tarefa agrícola de corpo e alma. Estabeleci uma disciplina rígida de trabalho, o que me permite estabelecer metas muito concretas, cumprindo objetivos específicos.
Aprendi que as megalomanias com um terrenos tão grande, só tornam as coisas inexequíveis. Agora, entendo que o meu mal foi pensar que poderia ter um terreno todo bonitinho e todo cultivado. Hoje, vou semeando e plantando em espaços pequenos, e produtos variados. Por outro lado, vou aprendendo com estas pequenas experiências como forma de mudar uma ou outra coisa de futuro.

Aqui fica a génese deste projeto:




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